Não vemos as coisas como elas são - vemos as coisas como nós somos. Alcançar a felicidade requer a superação dessas limitações sem transgredir os próprios valores e posicionamentos.
De onde vem essa cegueira eterna que nos faz lidar com o novo usando os velhos padrões? Estamos reduzindo as possibilidades de nossa vida e limitando o potencial de nossa obra pela dificuldade de nos abrirmos verdadeiramente para o horizonte mais amplo do novo. Os padrões que formatam nosso olhar sobre a existência também criam uma cortina de fumaça que nos ilude e confunde nossas percepções.
Albert Einstein nos ensina que “não é possível resolver os problemas no mesmo nível de consciência que os criou”. É preciso transcender o estado do pensamento e da percepção que gerou determinada situação ou relação e funcionar em um estado mais amplo e, portanto, mais cheio de possibilidades.
A forma como enxergamos a realidade é que a modela. Vivemos dentro dos limites de nosso olhar, de nossa percepção. Cada um de nós modelou uma lente, uma forma de ver a realidade, ou o que a ciência chama de paradigma. Essa formatação não é a verdade – é apenas um modelo pessoal da verdade. Sendo assim, é preciso que estejamos atentos à possibilidade de ver outras formas, outros modelos de mundo.
Estado tão ambicionado quanto fugidio, a felicidade é assunto de permanente interesse em qualquer latitude. Ao lado da espiritualidade, das relações interpessoais saudáveis, da ecologia e da cultura, ela figura entre os temas de destaque do VII Congresso Transpessoal Internacional, promovido pela Associação Luso-Brasileira de Psicologia Transpessoal (Alubrat) em Águas de Lindoia (SP) entre 4 e 7 de setembro. Uma das palestrantes do evento, a educadora e escritora Dulce Magalhães, mostra a seguir que chegar à felicidade envolve necessariamente uma grande transformação interior.
Não há perda, desafio, problema ou circunstância com a qual não possamos lidar. Tudo pode ser integrado em novos níveis de consciência e, dessa forma, somos capazes de transcender o desafio sem transgredir nossos valores e posicionamentos. Aliás, só estaremos resolvendo verdadeiramente uma questão se estivermos em alinhamento com nossa própria consciência e guiados por nossos valores mais caros.
Há muitas outras formas de perceber a mesma realidade, além daquela que estamos usando. E nenhuma delas será mais vantajosa do que a alternativa da felicidade. Estar em perfeita integração consigo mesmo, em sintonia com valores coletivos de fraternidade, liberdade e igualdade, sermos inspirados por ícones que buscam elevar a consciência individual e planetária. A felicidade é a criação de um cosmos dentro do caos.
A separação entre a causa e o efeito, entre indivíduos ou entre perspectivas é ilusória. Tudo está interligado e funcionando em uma grande e harmoniosa intenção correta. Por vezes somos incapazes de percebê-la, mas o tempo, o grande curador de todas as feridas, sempre revela que nada está sem sentido e nenhuma ação é desconectada da fonte.
É preciso transpirar uma nova realidade para poder vivenciá-la. Enquanto não nos posicionarmos e não fizermos a escolha, viveremos no mundo que não escolhemos nem desejamos. Este é um momento de con-vocação, de re-união, de re-construção. O chamado já está sendo feito; que possamos atendê-lo e nos seja dado o privilégio de nos tornarmos a mudança que queremos ver no mundo, como nos ensinou Mahatma Gandhi.
Tempo de crisálida
É preciso deixar morrer. É preciso aprender a liberar o que já não é mais. Há partes de nós que resistem, apesar de obsoletas. Que certezas carregamos sem questionar? Onde estão nossas dificuldades de aceitação que não nos permitem sair do sofrimento?
Há tempo para tudo na vida. Mas é preciso deixar morrer a lagarta. A semente do que fomos e as ilusões nas quais construímos nossa visão de mundo foram uma etapa necessária da existência, mas chega o momento da transformação. Aquilo que era bom não representa mais o futuro.
A segurança não pode ser medida pela convicção, mas pela habilidade de duvidar e, mesmo assim, ser capaz de seguir em frente. A lagarta é a promessa do que podemos nos tornar; contudo, não é a experiência completa nem um fim em si mesma. É uma etapa inicial, acertadamente percorrida. A infância da vida, o desabrochar da inocência, a experimentação da realidade.
Então há o momento de deixar a lagarta morrer. Esse é o tempo da crisálida. Quando saímos das certezas aprendidas para as verdades elementares. Introjetamos a experiência e repassamos a vida pelo crivo caloroso da essência. Existe alegria, júbilo nessa vivência, pois não há nada melhor do que renascer. Nascer pode não ser uma escolha, mas renascer é fruto da consciência que acorda e deixa morrer aquilo que não vive mais.
Claro que, como qualquer das passagens da existência, tornar-se crisálida não é uma experiência isenta de tumulto. Há estertores da antiga lagarta que resiste em desaparecer, sem compreender que de fato se transforma em algo maior e melhor. A crisálida contém a lagarta, mas vai muito além dela.Essa interiorização a que a crisálida convida é um estado reflexivo, de harmonização entre o ser e o fazer, entre o desejo e o destino. É a edificação da consciência em estado de maturidade. É, ao mesmo tempo, um estado de insensatez, de loucura, de fazer coisas inesperadas, fora do senso comum. É preciso muita maturidade para enlouquecer de forma sensata.
Loucura mesmo é permanecer lagarta. Arrastar- se por aí, sem perceber a magnificência da vida. Acordar e dormir sem perceber que o tempo entre esses dois momentos é o mais significativo. Não será em nenhum outro dia, nenhum outro momento e nenhum outro lugar. Especialmente, não precisamos ser outra pessoa para nos transformarmos. O ser que somos já basta. É preciso lembrar que a lagarta é semente e que a experiência acumulada é a matéria-prima na qual podemos construir o casulo que vai abrigar a crisálida.
É tempo de se voltar para o interior, a essência. Um momento de recolhimento das distrações do mundo. O sabático do cotidiano. Na aparência, aos olhos apenas focados no exterior, a crisálida é um casulo de morte. É o fim da lagarta e nada mais se vê. Não há beleza nem movimento, nenhum tipo de ação. É o fim de um ciclo, mas não se pode adivinhar o que virá daí. É preciso aprender a confiar no fluxo, acreditar no sábio processo da natureza, que fará revelar aquilo que pode ser.
Muitos obser vadores desavisados vão condenar a crisálida. Vão apontar suas deficiências, suas perdas, suas dificuldades, sua fragilidade. Contudo, não se pode confiar na impressão das outras lagartas. Cada uma delas também haverá de experimentar o mesmo processo, cada uma a seu modo, porém lagartas não estão prontas para compreender a crisálida.
O que é uma aparente deficiência pode ser, de fato, um redimensionamento da experiência de existir. O que é percebido como perda pode, na verdade, ser um desapego libertador. As dificuldades nada mais são do que a consciência em pleno exercício, percebendo mais e, portanto, experimentando coisas e situações novas. É do falsamente frágil que surge a força, o vigor, a vida.
Por falta de experimentação, o vocabulário das lagartas condena a experiência de crisálida. A resistência se organiza, a crítica se intensifica, mas o processo não pode mais ser interrompido. Uma vez que a lagarta comece a se transformar, já não há mais volta. E é desse recolhimento, dessa autoimolação do passado que surgirão as condições para o desabrochar de uma nova experiência, mais ampla, mais rica, além de qualquer aspiração.
Da antiga lagarta se tem a experiência do corpo. Dos desafios vividos nascem as antenas da percepção. Da entrega surgem o veludo e as cores. O ser se apresenta além das restrições e, de par em par, desdobra suas asas e se permite voar para esse lugar mítico chamado felicidade. É para lá que estamos todos fadados a seguir.
Info: www.alubrat.org.br
* Dulce Magalhães,
Ph.D. em filosofia pela Universidade Colúmbia, mestre em comunicação empresarial pela Universidade de Londres e membro do conselho gestor da Unipaz SC, foi eleita uma das 100 Lideranças da Paz no mundo pela Geneve for Peace Foundation.
um belo texto ! se ao final não atribuisse à felicidade o tal "lugar místico" que se busca, a qual "todos estamos fadados a ir", pensaria estar lendo o C.S.LEWIS, famoso professor de literatura da Universidade de Cambridg/Inglaterra, que escreveu as "crônicas de Nárnia", um ex-ateu que se tornou um cristão-evangélico, e pregava aos soldados ingleses durante a segunda grande guerra. Devo concordar com toda a concepção altruista-filosófica da autora, que não recebeu títulos por acaso né, pois aliás quase tudo que aborda tem forte pendão biblico-cristão e também científico-cristão, no que concerne a compreensão do que vem a ser felicidade. Peca quando afirmar que a felicidade é um lugar mítico, NÃO É, é real, ou pode ser, depende de nossas decisões, ou de superarmos a nossa "vã maneira de viver" como disse o apóstolo Paulo. Mais do que reconhecer a inevitável reconstrução ou renascimento que estamos sujeito (se quisermos) para um novo patamar de "consciencia", podemos buscar e ter um relacionamento REAL e NÃO MÍTICO, presente e não etéreo, consciente e responsável (ou seja, não é fatalístico "todos estão fadados a ir", mas depende da vontade, do livre-arbítrio, da busca pela ser imanente e criandor, conduta responsável e não indolente) com a FONTE e ESSÊNCIA da felicidade, DEUS, o CRIADOR DE TODAS AS COISAS, O ARQUITETO DO UNIVERSO, A PRIMEIRA PESSOA DA TRINDADE, e JESUS, o DEUS encarnado, que foi morto e ressulcitou dos mortos e está entronizado a DIREITA de DEUS-PAI, aquele que DORA e que TIRA a VIDA, que concede a real FELICIDADE. Fico, portanto com a concepção genuinamente bíblico/científico de felicidade liderada por ISAAC NEWTON, que cria e entendia, que apesar da vaidade que nos rodeia (conclusão Salomônica) o que a palavra de Deus diz em PROVÉRBIOS 8:32: "Agora, pois, filhos, ouvi-me, porque FELIZES serão os que guardarem os meus caminhos". Diz o Senhor. Diferente das outras propostas, a proposta biblica de felicidade, assim como as fórmulas de Newton são infalíveis para a física e matemática, AQUELA, é válida e eficaz para todos os que crêem e obedecem.
ResponderExcluirGostei do texto e da autora, deixo a reflexão acima para sopesar o miticismo, com o realismo bíblico-cristão.
Abraço.
EDILSON BRAGA JUNIOR, pastor, advogado, estudante.