O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) está analisando representação impetrada pelo paraense Osório Pacheco Alves Filho. O morador de Tucuruí cobra do órgão a responsabilidade do Ministério Público por não ter dado encaminhamento célere ao Inquérito Criminal 465, que tramita desde 2004 no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O inquérito apura as responsabilidades do governador tucano, Simão Jatene, e de seu fiel escudeiro, Sérgio Leão, no escândalo que ficou conhecido como o Caso Cerpasa.
Os dois respondem pelos crimes de corrupção passiva; falsidade ideológica; crimes contra a fé pública e corrupção ativa. Simão Robinson de Oliveira Jatene é réu neste inquérito, iniciado em 2004, quando um fiscal do Ministério Público do Trabalho flagrou uma funcionária da Cervejaria Paraense S.A. distribuindo em envelopes um alto volume de dinheiro em notas miúdas para pagamento de funcionários que que estariam fora dos registros oficiais da empresa.
VERBA E CAMPANHA
Durante a fiscalização os documentos da empresa foram apreendidos e posteriormente foi constatada a existência de relatórios detalhados com nomes, datas e valores descrevendo, entre outros achados, a decisão registrada em ata de reunião da diretoria da empresa, de se pagar propina aos então secretários do governo Almir Gabriel, Simão Jatene e Sérgio Leão. Além da propina, a empresa deu dinheiro à campanha na qual Jatene se elegeu para o governo, em 2002, em troca de benefícios fiscais de ICMS para a empresa.
Decorridos mais de nove anos de tramitação, o processo continua parado, agora no STJ. Foi esta lentidão que fez com que o paraense Osório Pacheco Alves Filho entrasse com uma representação. Em 23 de agosto deste ano ele encaminhou ao Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP - um documento por Excesso de Prazo, previsto no artigo 87 do Regimento Interno do Ministério Público. A representação é em desfavor de Roberto Gurgel Santos, ex-Procurador Geral da República, e de Célia Regina Souza Delgado, sub-Procuradora da República.
Dentro do CNMP a representação teve rápida deliberação. Em 17/09/2013 o relator do processo no órgão - criado para ser um mecanismo do controle externo do Ministério Público – Jarbas Soares Júnior, encaminhou um ofício à Subprocuradora da República concedendo prazo de 15 dias para que ela respondesse sobre a demora na resposta ao Inquérito 465 do STJ.
Ela não respondeu no prazo, conforme consta no andamento do processo nº 0.00.000.001130/2013-92, que tramita no CNMP. De acordo com a assessoria do Conselho, o processo vai ter prosseguindo normal, independente da resposta da subprocuradora.
O relator, Jarbas Soares Júnior, não tem prazo para dar prosseguimento, mas, segundo a assessoria, deverá se manifestar e encaminhar para análise do Conselho, sem data determinada.
Nove anos depois, denúncia não foi apresentada
A assessoria da Procuradoria Geral da República disse que, “conforme o andamento processual do CNMP, a subprocuradora-geral da República Célia Regina Souza Delgado, por meio do Ofício CRSD/PGR/156, já respondeu o Ofício 67/2013/Gab/JS-CNMP”. Mas a resposta não consta no trâmite do processo, que pode ser acessado por qualquer um no site do Conselho Nacional do Ministério Público.
O representante, Osório Filho ressalta em seu documento que, decorridos quase nove anos da distribuição do Inquérito ao Relator ministro Luiz Fux, “os autos continuam a se arrastar morosamente sem que denúncia seja apresentada, os réus se vejam processados pelos hediondos crimes de corrupção, falsidade ideológica, entre outros, e à sociedade seja dado conhecimento das providências que foram ou estão sendo adotadas pelo Ministério Público Federal”.
Cerca de R$ 16 mi foram repassados em 2002
Dando prosseguimento à sua representação, Osório Alves Filho ressalta que os autos do Inquérito 465 foram redistribuídos para o ministro Napoleão Nunes Maia Filho em 24 de janeiro de 2013, “tendo havido, desde então, uma única manifestação da Procuradoria da República em 17/06/2013 (fls 2074/2076), estando os autos conclusos no Gabinete do ministro relator desde 21/06/2013”.
“.... é chegada a hora dos membros do Ministério Público Federal que atuam no Superior Tribunal de Justiça (STJ) prestarem contas à sociedade das razões de tanta demora e de tanta impunidade, e dos riscos de prescrição dos crimes cometidos pelo Governador do Estado do Pará e demais autoridades”, alerta Osório Alves Filho.
O “Caso Cerpasa” é um dos maiores escândalos de desvio de recursos Já visto na história da administração pública paraense. Em agosto de 2002, em plena campanha eleitoral, as anotações apreendidas pelo Ministério Público do Trabalho no escritório da Cerpasa deixavam claras as relações entre a empresa e a campanha tucana: “Ajuda a campanha do Simão Jatene para o Governo, reunião feita com Dr. Sérgio Leão, Dr. Jorge, Sr. Seibel, a partir de 30/08/02 (toda sexta-feira), R$ 500.000, totalizando seis parcelas no final”. Para a campanha a empresa passou um total na época de R$ 3milhões de reais, que corrigidos , se aproxima de R$ 6 milhões a valores de hoje.
PERDÃO FOI PAGO
Na época, segundo o inquérito policial, R$ 16,5 milhões foram repassados para Jatene e Sérgio Leão, após o perdão de uma dívida de R$ 47 milhões em recolhimento do Imposto Sobre Circulação de Mercadoria (ICMS), que a empresa deveria ter recolhido aos cofres públicos.
O prejuízo causado ao Estado pela dupla de denunciados pode chegar a valores atuais a mais de R$ 140 milhões, considerando o débito da empresa registrado em 1999.
As ex-secretárias da Fazenda na época do “benefício” dado à cervejaria eram Tereza Lusia Martires Coelho Cativo Rosa e Roberta Chiari Ferreira de Souza. As duas são acusadas dos mesmos crimes que envolvem Simão Jatene e Sérgio Leão.
No final de agosto de 2002, poucas semanas antes das eleições, a Cerpasa teria repassado mais R$ 202.050 para a campanha tucana, de forma indireta, disfarçados de “patrocínio das festividades do Círio de Nazaré”. Nenhum pagamento foi contabilizado como doação de campanha.
Nove meses depois da posse, Jatene assinou três decretos num único dia, 29 de setembro de 2003, concedendo à companhia um desconto de 95% no ICMS devido ao Estado e prorrogando seus benefícios fiscais por mais 12 anos, ao lado de outras 37 empresas.
O governador Simão Jatene tenta emplacar no Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), o companheiro de inquérito, Sérgio Leão. Leão deixou recentemente a Secretaria de Proteção para concorrer à vaga do TCM.
(Diário do Pará)