A ex-companheira de Lula acabou mesmo brilhando. Marina Silva tornou-se o elemento surpresa do primeiro turno da eleição presidencial e atrapalhou os planos do seu ex-colega de ativismo e partido.
Ao perder a ministra Marina dois anos atrás, Luiz Inácio Lula da Silva deve ter pensado: "Paciência...". Certo de que Dilma Rousseff e seu desenvolvimentismo eram o caminho à frente, Lula certamente não imaginava que a antiga heroína dos seringueiros pudesse liderar uma chapa presidencial de peso e convencer quase 20 milhões de brasileiros a segui-la.
Em tempos de aquecimento global, Marina Silva e o Partido Verde registraram um feito que já entra para a história da jovem democracia brasileira.
O PT e o o Palácio do Planalto começam agora a traçar sua estratégia para convencer aqueles que não votaram em Dilma Rousseff a optar por sua candidatura. É interessante tentar entender, então, por que a candidata escolhida a dedo por Lula, um presidente com cerca de 80% de popularidade, não venceu o pleito já no primeiro turno.
Por que, afinal, 54 milhões de eleitores preferiram dar seu voto a um dos outros oito candidatos? E por que 47 milhões de eleitores mostraram-se convencidos de que Dilma é a melhor opção para o Brasil?
Quem votou em Dilma claramente está feliz com o estado atual do Brasil. Não com tudo, obviamente, já que o país ainda tem problemas (na saúde, segurança, habitação etc) que levam gerações para ser solucionados.
Mas os eleitores da candidata do governo querem a continuidade do que têm hoje, do projeto político e econômico de Lula. Isso inclui o forte investimento na área social, o aumento do poder de compra das classes menos favorecidas e o fortalecimento do setor público, do aumento da participação estatal na Petrobras à expansão do funcionalismo.
Também inclui uma política externa mais agressiva, de liderança regional e engajamento em questões delicadas mundo afora. Mais: aqueles que votaram em Dilma podem até não gostar das críticas de Lula à imprensa e mesmo se indignar com as acusações de tráfico de influência na Casa Civil.
Mas acreditam que tais problemas sejam menores diante do projeto do PT para o país, que reduziu a pobreza e a desigualdade ao mesmo tempo em que criou condições para altas taxas de crescimento econômico e colocou o Brasil num posto de importância crescente no cenário internacional. O eleitor de Dilma orgulha-se do Brasil de Lula.
Já quem não votou em Dilma Rousseff quer mudança. Provavelmente não concorda com a expansão do setor público ou com a relação de proximidade entre Estado e sindicalismo. Também talvez não concorde com a política externa mais ousada e muitas vezes polêmica adotada pelo Itamaraty de Celso Amorim, que claramente elevou o status internacional do Brasil, mas também o associou a alguns regimes controversos.
Quem votou em José Serra, Marina Silva ou outros deve ainda ter se revoltado com as denúncias envolvendo a Casa Civil. Também pode não gostar da personalidade de Dilma Rousseff, tida por muitos como autoritária nas relações pessoais, nem da forma como o presidente Lula tem conduzido a relação entre governo e imprensa.
A extrema confiança do governo federal em sua forma de lidar com o setor de comunicação pode atrair muitos brasileiros, que veem em ações da imprensa a tentativa de minar o Executivo. Mas também pode alienar outros, que querem governantes mais receptivos a críticas e investigações.
Em tempo: os que não votam em Dilma alegando fisiologismo nas alianças políticas devem se lembrar que, no Brasil, a prática não foi patenteada por nenhuma legenda. A relação entre PT e PMDB sob Lula é parecida com a relação entre PSDB e PFL sob Fernando Henrique Cardoso. Justificável ou não, o modelo tem sido aplicado no Brasil de forma verdadeiramente democrática, ou seja, por praticamente todos.
Olhando para os argumentos acima, talvez seja mais fácil entender as opções dos brasileiros para o segundo turno. Não se tratará apenas de um plebiscito sobre o governo Lula ou sobre Dilma, já que agora o voto anti-Dilma não terá mais Marina Silva como opção. O tucano José Serra terá seu passado, seus projetos e sua personalidade avaliados tanto quanto os de Dilma.
Pelo menos em tese, segundos turnos são úteis para que o debate em torno de propostas e estilos seja aprofundado e para que os eleitores decidam não necessariamente quem desejam ver no poder, mas quem preferem. Trata-se de uma escolha entre um e outro. Por que votar em um, por que votar no outro. Ou por que não votar em um ou não votar no outro.
Agora é hora de decisão. É isto ou aquilo.
BBC Brasil - Rogério Simões
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